Em vias de fazer mais uma cirurgia
(dia 30), a ultima não fora uma experiência muito agradável, eis que me
transporto para uma poesia do poeta Carlos Nejar, Lisura, que diz assim: “Entras
na morte como entra em casa/ Desvestindo a carne, pondo teus chinelos e pijama
velhos/ Entras na morte como quem parte para uma viagem/ Não sabe o norte, mas
começa agora/ Entras sem escuros, sem punhais ocultos sob teu orgulho / Entras
na morte, limpo de cuidados breves; como alguém que dorme na varanda enorme,
entras na morte”.
Sim, morremos um pouco a cada dia,
mas como a natureza é sabia, morremos sem saber quando, onde ou como e, muitas
vezes, não damos conta da nossa hora quando ela chega. A não ser em caso de suicídio ou na morte datada dos condenados. E assim deixamos estupefatos aqueles que nos amam e indiferentes os que nos odeiam, pela simplicidade do
adeus.
A morte, de certa forma, desperta
nossos sentimentos, mesmo que seja de uma maneira um tanto quanto indesejável. Escreveu
Albert Camus: “como amamos os amigos que
acaba de deixar-nos, não acha? (...) A razão é simples! Para com eles, já não
há deveres”. Podem parecer palavras muito ásperas e frias, mas muitas vezes é
isso o que acontece. Quantas vezes ouvimos aquela frase de compaixão, tão comum, mesmo que tenha sido um grande desafeto -
“Coitado, era uma boa pessoa”. É o
contraditório da morte. A morte provém da vida, sem ela a vida não seria vida.
É uma situação que jamais gostaríamos
que acontecesse, mas é o percurso natural, viver e morrer. E Carlos Nejar
ensina que é possível fazer da poesia uma prece. Isso, talvez ajude a trazer
discernimento e calma, daqueles que me amam, quando precisarem viver o meu fim.
Mas qual o motivo de tocar nesse assunto, as vésperas de uma cirurgia? Medo? Não! É porque as complicações da operação anterior me fizeram ver que o viver é essa linha tênue e que posso "entrar" na casa da morte e permanecer vivo (ao menos) nos versos que escrevo. Afinal morrer não é o fim em si mesmo.
ecobueno15